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50 anos da Matriz, a menina dos olhos

Matriz, a menina dos olhos da cidade
Reportagem publicada originalmente no Jornal Aconteceu, de São Mateus do Sul (PR), em 5 de maio de 2014. Premiada com o 1º lugar na categoria Reportagem Livre no Troféu Araucária - Prêmio Adjori de Comunicação 2015
Há meio século era inaugurado um dos principais símbolos da religião em São Mateus do Sul; marco histórico, obra de arte arquitetônica e cartão-postal que atrai visitantes e ainda impressiona moradores pela riqueza de detalhes
Era fim de primavera. O calor anunciava a chegada do verão de 1964, mas não atrapalhava as visitas do padre Bronislau Bauer, que, sob as quentes vestes religiosas, rendia-se ao frescor convidativo do interior da nova igreja. A alvenaria gelada era novidade, mas os raios de sol que atravessavam os luxuosos vitrais do altar pela manhã equilibravam o clima da estação e o clima de fé, que, quem diria, era tamanho entre os fiéis a ponto de permitir-lhes levantar aquela imensa estrutura, e, após dez anos, enfim inaugurá-la. Era 8 de outubro, e o vigário alinhava a batina para receber com toda pompa a ilustre visita do bispo Dom Manuel da Silveira D’Elboux e do governador do Paraná, Ney Amintas de Barros Braga, para a inauguração da obra-prima do catolicismo em São Mateus do Sul.

Bauer era o terceiro pároco a acompanhar a construção da imponente Igreja Matriz São Mateus, que substituiria a emadeirada Igreja Nossa Senhora da Assunção, datada de 1900 e já pequena para tantos fiéis. O projeto audacioso, cujos rabiscos iniciais ainda permanecem no acervo da paróquia, evidencia o estilo neogótico europeu, com três naves, paredes de 25 metros de altura e espaço para mais de 600 pessoas sentadas, apresentado ao bispo dez anos antes, pelo padre Bronislau Koslowski. Era o primeiro passo para o sonho de ainda muito antes, da década de 1930, manifestado pelo pároco Estanislau Porzycki. Só nos anos 1950 foi colocado no papel pelo engenheiro João Venceslau Ficinski e no chão pelo pedreiro Alcebíades Fabrin, junto aos tantos outros que se envolveram na obra.

A construção começava, parava e era retomada. Isso por causa das dívidas acumuladas que precisavam ser quitadas para dar início às novas etapas. O nunca registrado investimento de alguns bons milhões de cruzeiros se tornou possível graças à colaboração dos fiéis, que doavam valores, ou mesmo porcos e Fuscas para serem rifados em prol da Matriz. O cinema destinava a arrecadação das matinês, as grandes empresas faziam sua colaboração. Os fiéis até colocavam em risco seus mais valiosos bens em prol da igreja. “Para concluir a construção, foi recorrido a um empréstimo, tendo como garantia a penhora das casas de alguns paroquianos”, revela Edmundo Gelinski, que lembra-se como hoje de quando ainda menino prestigiou a colocação da Pedra Fundamental da Igreja, em 21 de setembro de 1954, até mais do que a data da própria inauguração.

O padre Koslowski deixou a paróquia em 1955, quando assumiu Francisco Madej, antecessor de Bauer, que registrava com detalhes no Livro Tombo da paróquia as intempéries financeiras, os conflitos com os pedreiros, os desafios para a colocação das 21 mil telhas e as generosas contribuições da população, que enchiam de novas esperanças o projeto fadado às dificuldades.

Bauer chegaria em 1960, quatro anos antes da inauguração. Sua personalidade tida como muito carismática tornou-o um padre popular. E sua presença como primeiro pároco da nova igreja rendeu-lhe as homenagens e seu nome mantendo-o vivo, mesmo que simbolicamente, até hoje. Então, no dia 8 de dezembro de 1964, recepcionava a população, as autoridades políticas e religiosas e os convidados de honra para a cerimônia de bênção da igreja e a primeira missa solene. 50 anos atrás.
A cidade da igreja bonita

Se na época foi o mais audacioso projeto que se podia esperar, em termos de tamanho e requinte, hoje, a imponente Matriz figura como um dos principais cartões-postais de São Mateus do Sul. Silvano Surmacz, pároco que completa oito anos de dedicação à paróquia também em dezembro, é quem geralmente ouve os comentários mais saudosos dos visitantes, e acumula fotografias e pinturas da Igreja, na casa paroquial, presenteadas por fiéis orgulhosos. “As pessoas que passam por aqui levam de São Mateus a imagem de cidade da igreja bonita. Pela localização, ou é a primeira imagem que se tem da cidade, ou a última, para quem está seguindo rumo à Curitiba”, conta.

A Paróquia São Mateus hoje responde por mais 21 capelas, dividindo as cerimônias religiosas. Ainda assim, a Matriz impera. São cerca de 200 batizados por ano, 200 primeiras comunhões e 50 ou 60 casamentos. Cortada por um arco-íris ou iluminada pela lua cheia, sua figura recheia os álbuns de matrimônio, dividindo o protagonismo dos noivos.

Justificando os elogios, cada detalhe tem um propósito. O formato de cruz quando vista de cima; a torre alta para guiar os olhares ao caminho da fé; a característica cristocêntrica (Cristo ocupando o centro, no seu interior, obra do artista Marian Latochinski nos anos 1970); conduzida pelo Espírito Santo, logo acima, e rodeada pelos santos, que evidenciam a missão de produzir santidade, entre 12 colunas, que se referem aos 12 apóstolos. “É uma arquitetura fantástica, que fala por si mesma. Nada nela é por acaso”, descreve Surmacz.

A antiga igreja de madeira, que permaneceu ao lado da nova Matriz por mais alguns anos, foi desmanchada em 1969, e seu material ainda foi aproveitado em capelas e casas da cidade. Dela, manteve-se a imagem de Nossa Senhora das Graças, dos olhos de vidro, que segue abençoando as novas gerações de fiéis.
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